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Os fundos europeus são suficientes para a recuperação portuguesa?

Os fundos europeus são suficientes para a recuperação portuguesa?

Artigo de opinião do economista Pedro Braz Teixeira, autor do livro «O Euro e o Crescimento Económico», publicado pela Fundação.
3 min
Após negociações muito duras e prolongadas, o Conselho Europeu chegou finalmente a acordo sobre o novo pacote europeu: serão 750 mil milhões de euros (390 mil milhões a fundo perdido e 360 mil milhões emprestados a juros bonificados).

Um dos aspectos mais polémicos foi a condicionalidade que lhes estaria associada e o resultado final foi qualquer país ter o direito a vetar os fundos atribuídos a outro Estado-membro, se considerar que este não está a cumprir os compromissos. No entanto, este mecanismo tem um prazo de três meses e é a Comissão Europeia que tem a palavra final. Dada a experiência passada, o mais provável é que a Comissão “feche os olhos”, ainda que a ameaça de suspensão de fundos possa fazer alguma pressão para que estes não sejam escandalosamente esbanjados. 

A estes fundos soma-se o novo orçamento comunitário, de 2021 a 2027, totalizando 1,82 milhões de milhões de euros. Deste total, Portugal deve receber 57,9 mil milhões de euros até 2027, cerca de 4% do PIB por ano.

Será que estes fundos são suficientes para financiar a recuperação económica do nosso país após a recessão de 2020, devida à pandemia?

Os primeiros novos fundos poderão ajudar a recuperar da pandemia, embora haja limitações por não estarem imediatamente disponíveis. Mas a dificuldade maior deverá surgir posteriormente, por não estarmos habituados a utilizar – de forma proveitosa – montantes bem menores.

Antes de mais, tem que se salientar que estes montantes são muito mais elevados do que era habitual, ainda que a pandemia também seja uma crise muito mais forte do que qualquer anterior. Em segundo lugar, também convém referir que, implícita nesta questão, está a ideia de que o crescimento económico se obtém estimulando a procura. Ora, isto é apenas verdade em certas circunstâncias e, desde 1995 até 2011, Portugal teve excesso de procura (visível dos elevadíssimos défices externos), que não se traduziram em grande desempenho, mas numa lamentável estagnação (mais notória a partir de 2000), a par duma explosão do endividamento externo (de 8% do PIB em 1995 para 110% do PIB em 2011). 

Se quiserem, o símbolo maior dos erros deste período é o caso do Grupo Espírito Santo, que se arruinou e muitos outros em seu redor.  

Mais geralmente, a resposta habitual da economia portuguesa a um estímulo da procura é sobretudo um défice externo e apenas residualmente uma aceleração do crescimento do PIB.  

Para lá do muito curto prazo, o problema maior com que nos confrontamos não se encontra do lado da procura, mas do lado da oferta, na dificuldade de criar capacidade produtiva que se traduza em forte crescimento da produtividade. 

A (má) forma como temos usado os fundos europeus não tem conseguido resolver os nossos maiores estrangulamentos, sendo relativamente frequente “gastar” só para não “perder” estes recursos.  

Os primeiros novos fundos poderão ajudar a recuperar da pandemia, embora haja limitações por não estarem imediatamente disponíveis. Mas a dificuldade maior deverá surgir posteriormente, por não estarmos habituados a utilizar – de forma proveitosa – montantes bem menores. 

Teme-se o investimento em mais elefantes brancos, sendo o mais evidente o hidrogénio “verde”, uma tecnologia imatura, onde só deveríamos construir um projecto piloto e não os montantes absurdos de que se fala.  

Ou seja, teme-se (mais) uma gigantesca oportunidade perdida, com a agravante de esta oportunidade ser muito maior do que o habitual e, quase de certeza, irrepetível. A economia portuguesa poderá recuperar, em linha com os parceiros europeus, por duas vias, pela ajuda europeia e pela recuperação dos vizinhos, mas, a médio prazo, continuaremos a ser ultrapassados pelos países de Leste, se repetirmos os erros do passado.

Pedro Braz Teixeira é autor do livro «O Euro e o Crescimento Económico», publicado pela Fundação e disponível na loja online, por 3,15€ e com portes de envio gratuitos.

 

O acordo ortográfico utilizado neste artigo foi definido pelo autor.

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